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quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Messier e Vive la Différence: M46 e M47

Ha muito não caçava objetos do Catalogo Messier. Na Stonehenge dos Pobres sua grande maioria fica fora de meu alcance. O horizonte sul do Rio de Janeiro não compartilha o mesmo latifúndio celeste que a torre do Hotel de Cluny.  Lá Messier fez as observações que levaram ao mais famoso catalogo de nebulosas de todos.  
O Catalogo Messier traz o curioso karma de ser uma coleção de objetos a não serem observados. Messier nos diz no Almanaque francês "Coinassance du Temp"  para 1801 o seguinte:
"O que me levou a realizar o catalogo foi a nébula que descobri sobre o chifre sul de Taurus em 12 de setembro de 1758 enquanto observando pelo cometa daquele ano...  Aquela nébula tinha tal semelhança com um cometa em forma e brilho que me prontifiquei a descobrir outras para que astrônomos não as confundam com cometas que estão começando a brilhar."
Embora Messier e seus contemporâneos ainda não soubessem exatamente do que se tratava as nebulosas que observavam seu catalogo tornou-se um excelente mostruário das estruturas celestes ( DSO´s) que se apresentam no universo. Em suas 110 entradas  encontramos 39 galaxias , 57 aglomerados estelares , 9 nebulosas, os restos  de uma  supernova, um pedaço da Via-Láctea , um pequeno "ajuntamento de estrelas , uma estrela dupla e segundo alguns autores uma figurinha repetida...
Todos os objetos Messier se encontram ao alcance de modestos telescópios  sob céus escuros e sua maioria é viável até mesmo com binóculos. Muitos se apresentam até para a vista desarmada.  O catalogo Messier é o campo de provas que ajudou varias gerações de astrônomos amadores a desenvolverem sua técnica e suas capacidade observacional. Observar todos os objetos Messier é um marco na carreira de qualquer astrónomo amador ou não. É como tocar "Brasileirinho" para violonistas nacionais . Mesmo sabendo que nem todo catalogo é visível de terras austrais ele é fundamental.
Logo que me interessei pela astronomia e comprei meu primeiro telescópio meu  objetivo era conhecer o céu de uma forma geral. Saber as constelações , reconhecer as estrelas mais brilhante e coisas do gênero. Na minha inocente concepção eu descobri um meio que poderia garantir que eu estivesse observando o que eu achava que estava observando. Sabia que existiam "coisas"lá fora que eu não veria sem o auxilio de um telescópio. E usando as brilhantes estrelas que eu achava estar localizando como faróis para localizar estas coisas eu desenvolveria um método infalível para ter certeza do que eu estava vendo. Na época( isto continua valendo..) todas as revistas de astronomia disponíveis eram publicações estrangeiras e quase todos os guias também. De uma forma ou de outra acabei descobrindo o catalogo Messier . Pronto. Tinha todos os ingredientes necessários para uma obsessão...
E assim me recordo claramente de meus primeiros DSO´s. Como não poderia deixar de ser foram alguns dos mais famosos membros do Catalogo. E em pouco tempo eu tinha tido a feliz oportunidade de conhecer M45 ( As Plêiades), M42 ( A grande nebulosa de Órion) , M7 ( o aglomerado de Ptolomeu) , M6 (o aglomerado da borboleta) e M4 ( um dos globulares mais próximos da terra) . O tempo passou e fui conhecendo quase todo o catalogo. Alguns de seu membros fui visitar na terra de Messier .
O tempo passou e acabei tomando um imenso gosto por aglomerados abertos. 
As coisas estavam neste pé até minha ultima viagem até Búzios. Com um observatório mais generoso que a modesta janela da Stonehege do Pobres eu tive a oportunidade de revisitar e fotografar pela primeira vez dois dos meus favoritos aglomerados abertos do Catalogo de nosso caçador de Cometas do século XVIII.  M46 e M47.
M 46 é uma descoberta original de Messier. E é curiosamente a primeira entrada da segunda parte do levantamento que levou  ao que é o atual Catalogo Messier. Ele o descobriu em 19 de fevereiro de 1771.  Apenas três dias após ter publicado a primeira edição de sua obra que cobria de M1 a M45.

Por uma razão "navegacional" vou abordar M47 inicialmente. Localizar M 47 é mais fácil e estes é um porto fundamental no caminho que nos levará até M46.
Localizado dentro das fronteiras de Puppis ( Popa) o caminho até M 47 começa na mais brilhante estrela do céu.  Sirius. Após centralizar esta na sua buscadora eu acho localizar M47 bastante simples. Indo rumo leste e usando a Via láctea como guia M47 vai se apresentar  em sua buscadora .Mesmo como minha 7x30 mm ele é perceptível. Com a 9x50 ele é evidente e muitos membros se resolvem.
 Em condições mais extremas de poluição luminosa ou se habitas muito ao norte Phil Harrigton apresenta  um caminho mais geométrico. Em seu "Starwatch" ele coloca que localizar M 47 é uma questão de seguir triângulos . Três triângulos. Primeiro localize um formado por Sirius , Iotan Can Ma e Mulliphen mais a leste. Seguindo o lado Sirius- Mulliphein ainda mais a leste localize um triangulo menor e mais estreito ainda mais a leste; Seguindo ainda mais a leste um outro pequeno triangulo com um perfil semelhante e com mais estrelas em seu interior.Este ultimo triangulo  apresenta mais estrelas tênues em seu interior . São estas M47 e M46.
Nunca fiz o caminho proposto por Harrigton. Não foi necessário  e parece-me confuso.
M47 tem a honra de poder ser considerado um "Objeto Messier Perdido". Em seu amarelado livro de registros que hoje habita um vitrine no Observatório de Paris sua entrada de numero 47 apresenta coordenadas que nos levam a lugar nenhum.  Somente em  1934 Oswald Thomas identificou M 47  como Ngc 2422 . Segundo O´Meara 25 anos se passariam ainda até que T.F Morris descobrisse o erro de transcrição que levou ao erro por parte de Messier.
M47-  12 X 15 seg asa 3200

A descrição de Messier sobre o DSO deixa pouca duvida  de Ngc 2422 ser de fato M 47:
" (19 de Fevereiro de 1771) Aglomerado de estrelas não distante do anterior (M46). As estrelas são mais brilhantes. O centro do aglomerado foi determinado usando-se a mesma estrela . Flamsteed 2 Argo Navis ( hoje Puppis2)  . O aglomerado não possui nebulosidade".
Observado pelo Newton ( um refletor com 150mm e f8) é melhor observado com pouco aumento . Usando minha ocular 26 mm percebo algumas dezenas de estrelas  levemente azuladas como aguas marinhas vagabundas.  O campo onde habita M47 apresenta em sua proximidade uma outra bela gema vermelho alaranjada que não faz parte do aglomerado. Trata-se de KQ Puppis. Parece um rubi solitário. O conjunto forma um belo tesouro.
M 47 apresenta em estudos mais sérios pelo menos 117 membros com seus membros mais brilhantes atingindo 5a e 6a  magnitude.  Ele cobre algo com 25´de diâmetro (uma lua cheia).  Estando a não mais que 1550 anos luz de nós significa que o mesmo se espalha por cerca de 14 anos luz. É bem pequeno.  
A primeira pessoa a observar M47 foi Giovanni Batista Hodierna antes de 1654.
Depois de localizar M47 chegar até M 46 é bastante fácil. Com uma ocular wide field é só calcular um pequeno salto de cerca de 1 grau na direção certa e este vai se apresentar. Perceber M 46 pela buscadora não chega a ser um grande feito mas pode ser difícil em locais de muita poluição luminosa. Ele não chega a se resolver e apresenta-se apenas como uma tênue "nuvem de luz". Com meu binoculo 15X70 percebo algumas estrelas se resolvendo.
A comparação entre M46 e M47 é um excelente exemplo de como dois aglomerados abertos podem ser diferentes ( com o binóculo e os dois no mesmo campo isto é evidente). M46 é muito mais denso que M47 mas como suas estrelas são mais tênues a paisagem é muito diferente. E também nos mostra como as coisas são relativas. M 46 esta  5.300 anos luz de nós . Seu brilho menos intenso é somente por causa da distancia de nós. Ele possui no minimo 180 membros e com 300.000.000 é um ancião em comparação ao jovem M47 (55.000.000 anos) . E este se espalha por mais de 40 ano luz.  M 46 é muito mais gracioso que M 47 quando observado pelo Newton.  Com estrelas brilhando entre 10a  e 13a  magnitude e ocupando quase a mesma area que seu vizinho comprar um ao outro é quase comparar vegetais com minerais... Uma flor e uma rocha.            Messier  descreveu o aglomerado  assim:
" (19 de fevereiro de 1771)  Aglomerado de estrelas muito tênues , sem nebulosidade. Este aglomerado é próximo a três estrelas que repousam na base da cauda de Monoceros."
M46 é um dos aglomerados abertos que mais gosto. Extremamente denso e com grande concentração apresenta diversas estrelas duplas e com um olhar atento revela mais e mais estrelas. É um excelente exercício para praticar sua visão periférica e descobrir mais e mais  segredos encrustados. Em telescópios menores ( 60 mm e etc..) le não chega a se resolver . com visão periférica uma poucas estrelas podem ser percebidas e uma estrutura "arenosa" parece se apresentar.
M46 apresenta claramente uma estrutura espiralada . E guarda ainda um segredo. Ao aumentar a magnificação ( com a 10mm eu começo a perceber[120X]...) pode-se notar uma pequena nebulosidade ao norte do aglomerado.
M46 e Ngc 2438-12X 15  seg.  A nebulosa Planetaria é evidente abaixo do centro do aglomerado

Trata-se de uma nebulosa planetária. Ngc 2438. Os restos de uma estrela semelhante ao nosso sol estão lá. É apenas uma coincidência. A nebulosa se encontra penas na mesma linha de visada . Ela se encontra muito mais próxima que o aglomerado a "apenas" 2900 anos luz. E é fruto de uma estrela muito mais antiga que as "mocinhas" que formam M46.  Assume-se que a bela nebulosa planetária começou a se formar a meros 46.000 anos. A estrela central que alimenta esta nebulosa brilha com uma modesta 16a magnitude.
Ngc 2438
Messier ou não percebeu ou não diferenciou esta nebulosa do aglomerado. Em seu catalogo  existem nebulosas planetárias.

 Mas isto já é uma outra história....

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